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O Trabalho como um Fenômeno Social: a perspectiva dos clássicos


Introdução

Nesta postagem, você poderá ler um pouco sobre o sentido social do trabalho, percebendo-o como um fenômeno histórico que passou por mudanças no âmbito prático e também de valor. O trabalho é parte central da vida humana e é fundamental para a sociologia em seu esforço de compreensão da sociedade e suas transformações

O Trabalho como Fato Social

O significado atribuído ao ato de trabalhar tem variado ao longo do tempo. O trabalho sempre esteve ligado a maneira como as sociedades se organizaram socialmente. Assim, através da forma como uma sociedade concebia o trabalho, elas se estruturavam e estabeleciam as relações sociais protagonizados pelos indivíduos. Nesse processo, três grandes grandes acontecimentos marcaram a história do trabalho: 

Desenvolvimento Agrícola: quando os seres humanos começaram a cultivar plantas com o uso das ferramentas manuais simples e a criar animais, permitindo a multiplicação de assentamentos e posteriormente a invenção do arado. 
Desenvolvimento da Indústria Moderna: o início da produção industrial, marcada pela revolução industrial, que atrelou a produção a tecnologia e ao maquinário.
Desenvolvimento do Setor de Serviços: com o desenvolvimento da tecnologia avançada e o declínio do emprego industrial, viu-se o crescimento das atividades ligadas aos bens, a informação e a técnica. 

As diversas mudanças e impactos sociais que os acontecimentos ligados ao trabalho inauguraram na vida social o definem como um fenômeno passível de entendimento sociológico, isto é, como um fato social. Um fato social é tudo aquilo que é externo aos indivíduos, independente deles, capaz de impor ações específicas para eles e está dado de maneira generalizada na sociedade. Como um fenômeno de suma importância para a vida social, o trabalho logo se tornou objeto de estudo essencial da sociologia, sendo compreendido de diversas maneiras e enfoques, mesmo entre os clássicos.

Perspectiva de Durkheim

Durkheim entendia que a sociedade moderna estava socialmente doente, graças a ordem social inaugurada pelas recentes mudanças decorridas da revolução industrial. Em seu objetivo de explicar a nova ordem social, esse sociólogo concluiu que o trabalho seria um ingrediente fundamental para a regulação, coordenação e manutenção dos laços sociais, pois ele seria uma ferramenta necessária para a harmonia social e a integração social. 

De acordo com ele, nas sociedades mais simples haveria uma consciência coletiva forte e um maior senso moral, embora uma divisão de trabalho mais simples. Essa configuração social implicaria no que ele chamou de solidariedade mecânica, isto é, em uma força social ligada a uma moralidade intensa e a maior proximidade das pessoas, o que as levava a agir de modo mais harmonioso. Na modernidade, após a revolução industrial, a consciência coletiva, de acordo com Durkheim, se tornou mais fraca, o senso moral se tornou mais frágil e a divisão social mais sofisticada. Com essa configuração social, não seria mais papel de uma uniformidade de valores e regras morais a harmonização da sociedade, mas do trabalho que implicaria, através de sua sofisticação, a interdependência dos indivíduos, mesmo aqueles totalmente estranhos uns aos outros. O trabalho forçaria então a harmonia social e a interdependência a partir de sua própria dinâmica interna. 

Perspectiva de Marx

Para Marx o trabalho está relacionado a produção social da existência, aos modos de produção e as relações de produção. Assim, para ele, a maneira como organizamos a produção, o comércio e também o consumo influenciam as relações sociais, as ideias e as consciências dos indivíduos. Para Marx, o trabalho é uma forma de agir sobre a natureza, sobre o mundo e sobre si mesmo, se modificando no processo de criação e transformação de algo. 

Na sociedade capitalista, o trabalho é marcado pela luta de classes e pelo processo de alienação do trabalhador. Dentro do capitalismo, ao produzir o trabalhador perde seu próprio valor, já que para ele o trabalho não é voluntário, mas uma obrigação, auto-sacrifício, um meio para satisfazer necessidades impostas para ele pela sociedade desigual. O trabalho no capitalismo é sinônimo de desigualdade e dominação, pois nega o ser humano a felicidade, o bem-estar, sua condição física e psicológica, bem como a capacidade de se reconhecer e de reconhecer como seu aquilo que produz. 

Perspectiva de Weber

O trabalho vai ser pensado por Weber a partir da concepção de valor e dos seus sentidos na história. Por meio do seu estudo da racionalidade ocidental, manifestada no capitalismo, ele irá traçar ligações entre elementos éticos e religiosos do protestantismo e a forma pela qual os capitalistas orientam suas ações. Weber apontará que a partir do protestantismo a visão sobre o trabalho mudará radicalmente, sendo então valorizada como nunca antes na sociedade ocidental. O trabalho passa a dar significado a vida, tornando-se desejável e necessário. 

Com o protestantismo, surge a ideia de vocação, o entendimento do trabalho como uma obra relevante e dignificadora, bem como um espírito empreendedor que atrelado a ética ascética de controle dos prazeres inaugura a legitimação cultural da construção de um ciclo ligado a iniciativas de investimento, acumulação e lucro. O trabalho, na visão de Weber, portanto, passa por um significativa mudança cultural, a qual impacta diretamente em nossa subjetividade e serve, no nascimento do capitalismo, como elemento ideológico para o desenvolvimento da burguesia. 

Para saber mais sobre os clássicos e o trabalho leia aqui



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