Introdução
Berger e Luckman foram dois sociólogos que se empenharam para responder a pergunta do título. Para isso, voltaram-se para sociologia do conhecimento e através dela empreenderam uma análise de como se estrutura o conhecimento que dirige a conduta da vida diária. Para eles, não era suficiente saber que havia um conhecimento baseado na experiência, se fazia necessário saber como esse conhecimento poderia ser possível.
A Experiência do Real
A vida cotidiana é uma realidade dotada de sentido na medida que forma para nós um mundo coerente. Ela pode ser entendida como originária de nossas ações e pensamentos, decorrendo da naturalização de processos e significações. Nós experimentamos esse mundo a partir da consciência, que, de acordo com os autores, sempre será entendida como "consciência de algo", isto é, sempre será intencional, tendendo para algo objetivo ou subjetivo. É através da consciência que transitamos pelos diferentes níveis de realidade, tais como o sonho e o faz de conta. Apesar disso, a realidade da vida cotidiana ocupa uma posição privilegiada, pois é vivida em vigília, sendo tomada como evidente e natural.
As Propriedades do Real: como sabemos que não estamos sonhando
Essa realidade que tomamos como natural possui características importantes, as quais nos ajudam a tomá-la como o ponto de partida e como ordinária. Primeiramente, a realidade da vida cotidiana é objetivada, ou seja, está para além e é superior a mim, na medida que existe como algo entendido como real pela coletividade. Segundo, nela se vive a partir da interação e da comunicação, as quais são tomadas como natural e se mostram como indicadores da linguagem - instituição social ordenadora do mundo. Por fim, nela se encontra disponível, a partir da relação ensino-aprendizagem, um conhecimento prático, partilhado por todos, voltado ao ordenamento do mundo por meio de construções de sentido para as práticas da vida.
Interação Social: como construímos a sensação do real
Entender a realidade como socialmente construída só é possível se pensarmos isso através da interação. Na interação social, abrimos uma janela para nossa subjetividade por meio de sintomas de expressão diversos, tais como olhares, tons de voz, gestos e também através daquilo que carregamos como nosso repertório de experiências, as quais remetem não apenas ao nosso caso individual, mas também a nossa cultura. Todavia, isso não é feito de forma livre, pois a realidade da vida cotidiana é regida por esquemas tipificadores pelos quais apreendemos pessoas e coisas, estabelecendo com isso os modos pelos quais devemos nos comportar em cada situação social.
Atributos das Tipificações Sociais
Essas tipificações que orientam nossa conduta possuem algumas propriedades importantes que as dão forma, permitindo uma melhor compreensão. Primeiramente, toda tipificação é recíproca; depois, possuem uma características de anonimato que é progressiva, estando submetida a frequência dos contatos sociais e ao grau de intimidade que cada contato social apresenta. Isso significa que a vida cotidiana é apreendida e toma forma em um contínuo de tipificações que vão se tornando mais intensas e mais anônimas quanto mais se afastam das situações de interação face a face e daquelas com maior carga de afeto. Essas tipificações são a base fundamental para o surgimento das Estruturas Sociais.
Estruturas Sociais
As estruturas sociais podem ser definidas como a soma das tipificações e dos padrões recorrentes de interação estabelecidos por elas. A estrutura social é um requerimento fundamental para a vida cotidiana, pois é a partir dessas relações padronizadas que se faz possível a organização e constituição de um tecido social duradouro não dado a contingência das vontades individuais. A tipificação e a padronização de interações cria, pode-se dizer, limitações e uma forma convencionada que é tomada como certa para todas ações sociais humanas de um determinado tipo.
A Linguagem como a Argamassa do Real
Todo esse processo que até agora foi explicitado não seria possível se os seres humanos não fossem capazes de simbolizar e se comunicar. É a expressividade humana a ferramenta utilizada para objetivação da experiência, isto significa que é através dela que criamos elementos comuns a todos os seres humanos, dando forma a um mundo que tomamos como comum. A linguagem tipifica as experiências, organizando-as em categorias que fazem sentido para todos em um contexto social. Ela estabelece pontes entre as diferentes zonas da realidade, integrando-as em uma totalidade que faz sentido. Portanto, ela liga as experiências ao real, traduzindo-as em "objetos comunicacionais", ao mesmo tempo que modela o real através disso, encerrando um corpo específico de conhecimentos que é transmitido e compartilhado.
E Surge o Senso Comum
Esse conhecimento nos orienta no mundo e é fruto de nossa experiência e da experiência prévia de outros. Assistemático, ele se apresenta como esquemas ou receitas de ação que nos ajudam a normalizar atitudes, ações e pensamentos de um modo não rigoroso, orientando-nos para o habitual e para o prático, portanto, se tendendo a naturalização. Não obstante, isso não significa que não possa mudar, apenas indica que para que se modifique é necessário que um problema incapaz de ser solucionado pelos esquemas normais surja, levando assim ao processo de reflexão.
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